fevereiro 14, 2011

“NEGAR A SI MESMO” — O QUE É?!



Por Levi B. Santos

Jesus dizia a todos: “Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo...”
Lucas 9:23


Debrucemo-nos sobre a verdadeira idéia do que seja o “negar a si mesmo”, a fim de tentarmos compreender esta solene e profunda constatação do Mestre dos mestres.

A maioria das interpretações que se faz no meio religioso coincide em traduzir essa expressão dita por Cristo como se ela quisesse significar a negação e conseqüente repressão da satisfação de todos os apetites carnais, ou desejos instintivos, que quase sempre são considerados como inclinações para o mal. Tudo isso corrobora com aquilo que estava dentro dos limites da lei de Javé, e que para não ir contra a “lei de do amor de Deus” ou o amor aos homens, deveria ser negado.

“Conta o mito que o jovem Narciso, belíssimo, nunca tinha visto sua própria imagem. Um dia, passeando por um bosque, encontrou um lago. Aproximou-se e viu nas águas um jovem de extraordinária beleza e pelo qual se apaixonou perdidamente. Desejava que o jovem saísse das águas e viesse ao seu encontro, mas como ele parecia recusar-se a sair do lago, Narciso mergulhou nas águas, foi ás profundezas á procura do outro que fugia, morrendo afogado. Narciso morrera de amor por si mesmo, ou melhor, de amor por sua própria imagem ou pela auto-imagem".

O narcisismo é o encantamento e a paixão que sentimos por nossa própria imagem ou por nós mesmos, porque não conseguimos diferenciar um do outro. Freud criticava a humanidade em geral, pois nela, ele vislumbrava o narcisismo, essa bela imagem que os homens possuem de si mesmos, como seres ilusoriamente racionais e com a qual estiveram encantados durante séculos.

Nietzsche defendia que havia duas negações, quando assim escreveu: “existe a negação que encerra em si mesma a minha imoralidade. De um lado, eu nego um tipo de homem que até agora tem sido considerado como superior: o dos bons, dos benévolos, dos caridosos; de outro, contradigo uma espécie de moral que chegou a adquirir a certa preponderância, chamada mais claramente de a moral decadente, a moral cristã”.

O psicanalista Jurandir Freire via a presença do narcisismo no cristianismo, quando assim falou em uma entrevista concedida em 2003: “o pedido do tipo “seja tão perfeito quanto um dia você foi antes da queda” explica bem o funcionamento narcísico, o nosso velho e bom funcionamento narcísico. Eu diria quem dera que a gente continuasse nele em certos aspectos. Então eu sofria porque eu tentava decifrar o outro, e sofria ou então queria me transformar, e não sabia que eu chegava a um estado de perfeição que só podia imaginar como sendo da plenitude narcísica, que um dia eu havia tido”.

Ser um Narciso é ser alguém que está sempre se olhando concentrado em um espelho, e sua vida parece consistir em procurar unicamente seu reflexo no olhar dos outros. O outro não existe como indivíduo, mas apenas enquanto espelho. É bem verdade que muito do que passamos em nossas crises existenciais tem ligação com o narcisismo.

O embevecimento com a própria imagem levou Narciso a morrer afogado em “si mesmo”. Quando o desejo egóico de afirmar-se como o centro do universo, de ser reconhecido e admirado por todos, de ser o primeiro e o único, é sempre levado à frente em detrimento do outro, esse ser humano se isola, definha e morre em sua própria solidão.

P.S.: Diante do que foi exposto, ficam aqui, três questionamentos dirigidos aos leitores que se interessarem em fazer uma profunda reflexão sobre o que seria que Cristo queria dizer com essa emblemática expressão: “NEGAR A SI MESMO”.


1.O “Negar a si mesmo” (dito por Cristo) seria o mesmo que reprimir os desejos profundos e intrínsecos de nossa natureza em benefício de algo maior?

OU

2. Esse “Negar a si mesmo” significa simplesmente dizer NÃO ou um BASTA a esse encantamento narcísico, a essa bela imagem que fazemos de nós?

OU

3. Esse “Negar a si mesmo” diz respeito ao reconhecimento do nosso lado SOMBRA que, inconscientemente, projetamos no outro? Nesse caso, o “não negar a si mesmo”, seria o mesmo que não admitir o fato de que o comportamento “estranho” do outro, reflete o nosso eu interior coberto pela máscara social?

OBS: Para melhor entendimento, essa terceira opção poderia ser resumida da seguinte forma:

3. Será que esse “negar a si mesmo” não seria o reconhecer que o nosso eu interior está coberto pela máscara social?

Fonte: Blog Ensaios e Prosas

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